Democratizando a Democracia! Que maluquice é essa?
Meu amor vi chegando
Um trem de candango
Formando um bando, mas que era um bando
De orangotango pra te pegar
Vinha nego humilhado
Vinha morto-vivo
Vinha flagelado
De tudo que é lado
Vinha um bom motivo
Pra te esfolar
Quanto mais tu corria, mais tu ficava
Mais atolava, mais te sujava
Amor, tu fedia, empesteava o ar
(Chico Buarque)
O que é democracia?
Quais são as características de um estado democrático?
O que é liberdade de expressão?
Quais são os limites da liberdade de expressão?
Bora refletir sobre os motivos da ação?
Que democracia é essa que queremos?
No dia 7 de setembro, dia da independência do Brasil, amanhã, está programada uma manifestação em prol da democracia e tudo o que isso envolve. O movimento tem sido fomentado pelo Presidente Jair Bolsonaro sob a prerrogativa de “defesa da democracia e dos direitos constitucionais”. Segundo alguns especialistas, 7 de setembro de 2021 será um divisor de águas que definirá as relações entre os poderes; entretanto, não se acredita na tão falada ruptura institucional. Vontade é o que não falta, por parte daqueles que juram de pé junto que vivemos um estado de exceção, mas parece que não iremos tão longe nessa maluquice. O mantra entre os manifestantes do evento do dia 7 de setembro intitulada de “Nova Independência” é uníssono: Pela democracia e os direitos constitucionais. Mas afinal, que democracia é essa que tanto se quer resgatar?
O que é Democracia? Culpemos os Gregos, de novo!
Resumidamente falando, democracia determina que o povo detém o poder que é outorgado àqueles representantes por ele, o povo, escolhidos através de eleições diretas. Simples assim! A palavra em grego é dēmokratía, que significa, literalmente, “governo do povo” (demos, significa povo e kratos, poder). Resumidamente falando, eu e você escolhemos representantes, através do processo eleitoral, para governar por nós; ou melhor, para nós. É o que está prescrito na Constituição Federal no seu Art. 1º, parágrafo único, sob o título Dos Princípios Fundamentais (clique aqui para saber mais):
“Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”
Mas afinal, o que isso quer dizer, na prática? Quer dizer que a vontade do povo é soberana e que o estado democrático de direito, que é vontade popular, tem características básicas que o descreve, as quais precisam ser salvaguardadas pela constituição. Mas, quais são essas características?
Quais são as características de um estado democrático?
O estado democrático de direito prescreve uma série de prerrogativas que os representantes escolhidos pelo povo, eu e você, através do processo eleitoral; têm que salvalguardar com base na constituição. São elas, basicamente, o direito de ir e vir assim como também o direito à livre expressão; à liberdade religiosa; os direitos individuais e das minorias; tudo em consonância com o bem comum respeitando a vontade da maioria; afinal, na democracia, a maioria leva.
Apesar de um estado democrático de direito trazer em seu âmago uma série de prerrogativas, o que está em discussão, essencialmente, no movimento do dia 7 de setembro, é a liberdade de expressão. Os manifestantes que irão às ruas amanhã afirmam, com todas as letras, que vivemos um estado de exceção onde a liberdade de expressão está sendo cerceada pela Suprema Corte Federal, contrariando os pressupostos democráticos, arbitrando em dissonância com a Constituição Federal. Ora, o que é liberdade de expressão, afinal?
O que é liberdade de expressão?
Sem maiores delongas, liberdade de Expressão é o direito que todo e qualquer indivíduo tem de emitir opinião sem ser reprimido quanto a este direito. A liberdade de expressão também permite que as informações e opiniões sejam transmitidas por diversos meios de comunicação sem censura prévia. Trocando em miúdos, é o direito de falar o que você pensa ou divulgar informações e opiniões através dos meios de comunicação. Quer dizer que eu posso falar o que eu quiser? Não é bem assim. Então, quais são os limites desse direito?
Até aonde vai o direito de botarmos a boca no trombone?
O direito de expressão é garantido pela Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 (clique aqui para saber mais) e está prescrito em um estado democrático de direito e, portanto, é legítimo e deve-se sim lutar por ele. Todavia, existem limitações, também prescritas nas prerrogativas democráticas, quanto ao exercício deste direito. Por exemplo, as opiniões e informações que denigrem a imagem de instituições e indivíduos, assim como as que desencadeiam desordem pública e desacatam autoridades constituídas; são todas, ilegais e passíveis de sanções previstas no código penal. Portanto, espalhar falsas informações que podem intervir no mercado financeiro, ou que possam desencadear convulsões na população, ou emitir opiniões que confrontem e desacatem autoridades constituídas democraticamente, ou denegrir a imagem de instituições e/ou indivíduos com falsas informações; não é um exercício da democracia. É crime previsto em lei. Portanto, precisamos refletir sobre os nossos atos antes de os praticarmos, porque depois de feito… Mas refletir sobre o quê?
Bora refletir sobre os motivos da ação?
No dia 10 de abril de 1984 mais de 1.2 milhão de pessoas, aproximadamente, se reuniram em frente à Igreja da Candelária, Rio de Janeiro, em apoio à emenda Dante de Oliveira que reivindicava eleições diretas para presidente no início de 1985. Diferentes partidos políticos, entidades sindicais, movimentos organizados e representantes de amplos setores sociais estavam lá cantando o Hino Nacional juntos puxado pela cantora Fafá de Belém. Chorei! Não vi uma vidraça quebrada, um patrimônio público ou privado depredado, não ouvi aquele abjeto: “nós contra eles”. Ninguém me contou; eu vi! Eu sabia por que estava lá. Todos sabiam. Muitos, como eu, nunca havia votado para presidente na vida! Era uma reivindicação legítima de um estabelecimento de um estado democrático de direito de fato, após longos 20 anos.
A maior manifestação popular no Brasil aconteceu no dia 13 de março de 2016. Mais de 3,3 milhões de brasileiros foram às ruas, Brasil a fora, protestando contra o governo da presidente Dilma Rousseff e a favor da manutenção, da já tão pressionada pelo “establishment”, Operação Lava Jato. Estive no Palácio dos Esportes Djalma Maranhão em Natal, Rio Grande do Norte. Novamente eu, e todos que ali estavam, sabiam o porquê de estarmos ali. E agora? Por que vamos às ruas amanhã?
Que democracia é essa que queremos?
Os manifestantes de amanhã apontam como motivo de irem às ruas o direito à liberdade de expressão e à manutenção dos direitos democráticos constitucionais. Reinvindicação para lá de justa de um povo que vive oprimido sob um regime ditatorial. Apoio integralmente! Mas vivemos esse estado de exceção tão alardeado pelo Presidente e seus seguidores? Então vamos lá:
- Escolhemos os nossos representantes através de eleições diretas e democráticas? SIM.
- Temos o direito de ir e vir preservado? SIM.
- Os meios de comunicação estão censurados, no que diz respeito às informações e opiniões que não denigrem a imagem de indivíduos e/ou instituições; que não incitam a violência; que não desacatam autoridades constituídas? NÃO.
- Temos o direito à propriedade? SIM.
- Podemos nos reunir em grupos, em eventos públicos, para manifestar nossas opiniões e reinvindicações? SIM.
A conclusão que chego é que o Brasil é o único país do globo terrestre que quer democratizar a democracia. Por favor, minha gente brasileira, inventa outra!
Próximo.
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